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sábado

MECANISMOS DE ADAPTAÇÃO DAS ÁRVORES À DEFICIÊNCIA HÍDRICA

Rogério Goularte Moura124 & Michelle Carmelinda Pegorini Bordini135
1Eng. Florestal - UFMT
2Mestre em Silvicultura e Manejo Florestal - ESALQ/USP
3Mestre em Conservação de Ecossistemas Florestais - ESALQ/USP
4Doutor em Ecologia Aplicada - CENA/ESALQ/USP
5Doutoranda em Ciências Florestais - UNB

1. Introdução

         Muitos trabalhos têm investigado a resposta das plantas ao déficit hídrico, sugerindo vários mecanismos de adaptação utilizados durante o ciclo de desenvolvimento das plantas, que podem afetar o seu desenvolvimento normal (Santos & Carlesso, 1999).
            Na literatura, encontram-se trabalhos envolvendo algumas espécies de Eucalyptus com estresse hídrico, basicamente pesquisas envolvendo seleção e estudos de resistência. As espécies mais estudadas são: E. camaldulensis; E. grandis; E. spathulata; E globulus; E. urophyla; E maculata; E. viminalis e E. marginata, apontando as possibilidades de utilização destas espécies para coberturas de regiões áridas, além de sua reconhecida utilização na indústria madeireira, de papel e celulose, e resinas (Souza, 1997).  
O crescimento e desenvolvimento de árvores são influenciados quando submetidos a vários graus de desidratação (Koslowski, 1971). Água, como fator limitante, parece assumir maior importância em espécies do gênero Eucalyptus, durante a fase inicial da cultura, isto é, processo como germinação, enraizamento e desenvolvimento caulinar, ficam comprometidos diante da deficiência hídrica (Awe et al. 1976).
A ocorrência de déficit hídrico afeta o crescimento e o desenvolvimento das plantas em todo o mundo, principalmente na região tropical, existindo com isso um conflito entre a conservação da água pela planta e a taxa de assimilação de CO2 para produção de carboidratos (Taiz & Zeiger, 1991). A necessidade de resolver este conflito leva a planta a desenvolver mecanismos morfofisiológicos, que as conduzem a economizar água para uso em períodos posteriores (McCree & Fernández, 1989). Esses mecanismos procuram ajustar as plantas aos períodos de maior demanda evaporativa da atmosfera e à redução do conteúdo de água no solo.
Desta forma, o presente trabalho teve como objetivo relatar mecanismos de adaptação das árvores a deficiência hídrica.

2. Deficiência hídrica

            A deficiência hídrica ou “seca” significa um período sem precipitação considerável durante o qual o conteúdo de água no solo é reduzido, de forma que as plantas sofrem com a ausência de água.
O déficit hídrico pode afetar o desenvolvimento do dossel vegetativo através da alteração no número total de folhas da planta, na taxa de expansão e na senescência. Esses componentes são importantes na obtenção da área foliar disponível à transpiração e assimilação (Arkin et al., 1978).
Para Carlesso (1995) a quantidade de água armazenada no solo varia com a sua textura, o que leva as plantas a apresentarem diferentes comportamentos em relação aos mecanismos de adaptação. Solos com textura fina ou aqueles com grande quantidade de colóides ou matéria orgânica armazenam mais água do que os solos de textura grossa (Larcher, 2000).
Segundo Porto (1993) a quantidade de água do solo utilizada pelas plantas depende de quatro fatores:
Demanda evaporativa da atmosfera;
Habilidade da planta em regular o fluxo de água através do sistema radicular até a parte aérea;
­   Exploração das reservas de água do subsolo pelo sistema radicular; e
­   Condutividade hidráulica do solo.

A sensibilidade dos mecanismos de adaptação das plantas ao déficit hídrico depende do estágio de desenvolvimento da planta. Segundo Kramer (1995) o efeito do déficit hídrico sobre a maioria das culturas varia de acordo com sua duração, intensidade e período de ocorrência no ciclo da cultura. Para o autor, o déficit hídrico ocorre quando a quantidade de água absorvida pela planta é menor que a quantidade de água transpirada, de forma que os tecidos da planta não ficam totalmente túrgidos.

3. Mecanismos de adaptação

Os mecanismos de resistência ao déficit hídrico, segundo Begg & Turner (1976) podem ser de três tipos: “evitar”, “tolerar” e “escapar” ao déficit hídrico.

3.1. Evitar
             São mecanismos que retardam ao máximo possível a desidratação da planta, para evitar chegar a um déficit hídrico. A estratégia é aumentar ao máximo a captação de água e reduzir ao mínimo suas perdas. Segundo Levitt (1980) existem dois extremos na estratégia de evitar: plantas economizadoras de água (water savers) e plantas gastadoras de água (water spenders). Estes dois tipos de comportamento podem ser chamados também de pessimistas e otimista. As plantas economizadoras são aquelas cuja estratégia é definida por uma redução das perdas de água mediante o fechamento estomático, redução da transpiração cutícular, redução da superfície de transpiração e aumento da resistência hidráulica das raízes pelo acúmulo de água. As plantas gastadoras são aquelas cuja estratégia se baseia no aumento da absorção de água com o objetivo de poder manter elevado as taxas de crescimento, fotossíntese e conteúdos relativos de água nos tecidos. Isto só é possível com o crescimento da superfície radicular e redução da resistência hidráulica. Contudo as plantas gastadoras de água podem esgotar os recursos hídricos e esta estratégia só é mantida em períodos de seca moderada ou de curta duração. Quando os recursos hídricos do solo se esgotam, muitas espécies gastadoras se convertem em economizadoras. Existem muitas situações intermediárias a estes dois extremos como, por exemplo, uma planta otimista com pouca superfície foliar.

3.1.1. Fechamento estomático

Os estômatos são as vias de troca gasosas nas plantas. Seus mecanismos de abertura e fechamento controlam as perdas de água.
Assim, em períodos de seca, quando a demanda evaporativa é maior, o fechamento estomático permite a redução das perdas de água, permitindo a manutenção do potencial hídrico e conteúdos hídricos relativos mais próximos a saturação, e com isso a manutenção da turgescência celular (Figura 1.).

Figura 1. A transpiração diurna de jovens plantas de Pinus radiata; a) com bastante disponibilidade em água; b) depois de 9 dias sem água; c) depois de 12  dias sem água. Larcher (1995).

Os locais de fechamento estomático, grau de fechamento e as taxas de fechamento e abertura são muito variáveis, dependendo da espécie, do ambiente e da idade de cada folha (Meidner & Mansfield, 1968). Os mecanismos pelos quais a deficiência hídrica induz ao fechamento estomático devem-se aos sinais hidráulicos, hormonais ou por uma combinação de ambos. Evitar perdas de água através do fechamento estomático tem como contrapartida uma redução da captação de CO2 e aquecimento da folha que podem causar deficiência nutricional e danos a sua estrutura celular, respectivamente.

3.1.2. Redução da transpiração cutícular

O fechamento estomático reduz as perdas de água majoritariamente. Contudo existe uma certa quantidade de transpiração inclusa quando os estômatos estão completamente fechados.
A transpiração cutícular pode apresentar até 50% do total da transpiração em algumas mesófitas ou somente 2% no caso de algumas xerófitas (Levitt, 1980).
Um mecanismo de evitar consiste em reduzir a taxa de transpiração cutícular (Figura 2.). A cutícula é uma cobertura polimérica extracelular, depositada na parte externa da parede celular (Martin & Juniper, 1970; Cutler et al, 1982). Predominantemente está composta por uma matriz polimérica de cutina, compactada e estabilizada mediante ceras cuticulares que formam agregados sólidos e parcialmente cristalinos (Schreiber & Riederer, 1996).
        Em experimentos de deficiência hídrica em curto prazo observa-se um aumento da resistência cutícular pela redução do conteúdo hídrico foliar, que causa uma dessecação da cutícula; essa dessecação induz mudanças estruturais na cutícula que reduzem a permeabilidade ao vapor d’água. 

Figura 2. Diagrama das mudanças na transpiração ao longo do dia à medida que a umidade do solo diminui (curvas 1 a 5). As setas indicam o movimento dos estômatos induzidos pelas mudanças no balanço hídrico. A área escura mostra a zona em que a transpiração é exclusivamente cuticular. 1. transpiração sem restrições; 2. limitação da transpiração durante o meio dia à medida que os estômatos se fecham; 3. fechamento estomático ao meio dia; 4. interrupção total da transpiração estomática devida ao fechamento total dos estômatos (só ocorre transpiração cuticular); 5. transpiração cuticular consideravelmente reduzida devido à contração da membrana.  Larcher (1995).

Em experimentos de deficiência hídrica de até semanas, observou-se um aumento na deposição de cera epicuticular (Skoss, 1955) e também se notou como a taxa de transpiração cutícular aumenta quando se eliminam as ceras epicuticulares.
Existem numerosos trabalhos que relacionam a composição da cutícula com as taxas de transpiração cutícular em diferentes espécies de diversas procedências (Schreiber & Riederer, 1996).

3.1.3. Redução da superfície de transpiração

É evidente que as perdas de água ocorrem principalmente através da superfície foliar, quanto maior a superfície foliar maiores serão as perdas potenciais. A redução da superfície de transpiração estabelece um bom controle das perdas.
Tem sido descritas diferentes formas de redução: a nível foliar podemos falar de enrolamento ou enrugamento para reduzir a superfície exposta (Blum, 1988) e de abscisão foliar. O enrolamento causa redução na área foliar efetiva da folha e, conseqüentemente, na área foliar fotossinteticamente ativa da planta, redução da desidratação e redução no consumo de água em períodos de elevada demanda evaporativa (Jordan, 1983). Aguiar (1993) salienta que a diminuição da área foliar do dossel é um importante mecanismo de adaptação a períodos de déficit hídrico.
Outro aspecto que contribui para a redução da transpiração é a reorientação das folhas e brotos para reduzir a captação de energia, que implica em uma menor taxa de transpiração por unidade de superfície transpirante.
O desenvolvimento e a duração da área foliar fotossinteticamente ativa da planta determinam, de acordo com Dale (1988) a fração de radiação solar a ser interceptada pelo dossel da cultura, influenciando o desenvolvimento e a produção final.
A morfologia da cobertura vegetal também tem influência: uma folhagem compacta e densa permite uma maior retenção de água pelo efeito da ventilação e o balanço térmico.

3.1.4. Adaptação do sistema radicular

Nas plantas economizadoras, a estratégia de redução de perdas chega a modificação das raízes, através de uma redução da superfície radicular e uma diminuição da permeabilidade para evitar perdas em solos muito secos. Também aumentam a resistência hidráulica para diminuir o fluxo hídrico até a copa. Por outro lado, a estratégia das plantas gastadoras ou otimistas é a contrária. O mecanismo de evitar a seca é conseguido mediante o aumento da absorção de água que permite manter uma maior taxa de transpiração e, conseqüentemente, a manutenção da fotossíntese.
Assim, em condições de seca as gastadoras tem taxas de fotossíntese e crescimento maiores que as economizadoras. Para manter estas taxas, tem que manter a turgescência e um conteúdo relativo de água elevado e para isso tem que absorver tanta água quanto é transpirado. Estas plantas têm resistências hidráulicas muito menores que as economizadoras. A absorção mantém-se aumentando a superfície radicular, mas não a aérea foliar.
Cada unidade de superfície foliar está abastecida por mais unidades de superfície radicular, que exploram um maior volume de solo e extraem mais água. Isto leva a um esgotamento de recursos mais rápido, que na ausência da diminuição da transpiração leva a murcha. Por isso quando uma planta gastadora é obrigada a reduzir suas taxas de transpiração, diz-se que esta se converte em economizadora (Levitt, 1980).
Expansão do sistema radicular para zonas mais profundas e úmidas do perfil do solo (Figura3.). De acordo com Hoogenbomm et al. (1987) em condições de déficit hídrico há maior expansão das raízes, devido ao secamento da superfície do solo. Durante o desenvolvimento das plantas, a densidade e o comprimento de raízes aumentam até o início da floração das plantas, decrescendo posteriormente, com diminuição na eficiência de absorção de água (Pimentel & Rossielo, 1995).
         O estudo de Ball et al. (1994) demonstram que o maior desenvolvimento das raízes ocorre nas camadas de solo, cuja disponibilidade de água foi maior. A expansão das raízes no campo foi mais afetada pelo déficit hídrico que a expansão das folhas e as raízes pequenas foram mais sensíveis ao déficit hídrico que as raízes médias e grandes. O desenvolvimento do sistema radicular nas camadas mais profundas do perfil possibilita, às plantas, explorar melhor a umidade e a fertilidade do solo, dependendo das características morfológicas e genotípicas da planta (Goldmann et al., 1989).
     O efeito do excesso de Al+3 na zona das raízes freqüentemente impede seu desenvolvimento nas zonas mais profundas do solo, o que pode aumentar o efeito indireto do déficit hídrico (Kauffmann & Gardner, 1978).
Davies & Zhang (1991) sugerem que há evidências de sinais químicos das raízes que agem diretamente no comportamento dinâmico dos estômatos em condições de déficit hídrico no solo.
          Pimentel &  Rossielo (1995) afirmaram que um ligeiro ressecamento do solo, mesmo que não afete as relações hídricas da parte aérea, causa um aumento na concentração de ácido abscísico (ABA) no xilema, provavelmente produzido na coifa das raízes, levando ao fechamento estomático e à diminuição da expansão celular. Segundo Zeevaart & Creelman (1988) o déficit hídrico promove uma rápida redistribuição e acumulação do ABA nos tecidos da planta; assim, de acordo com Tuberosa et al. (1994), ocorre um aumento na concentração do ABA no apoplasto das células-guarda, reduzindo a condutância estomatal.

Figura 3: Aprofundamento e expansão do sistema radicular de Malus sp. (A) Extensão em largura e (B) Extensão em profundidade. Peréz (1999).

 A deficiência hídrica  desencadeia a síntese do ABA, a partir dos carotenóides na raiz, que é transportado como um “sinal da raiz” para diferentes partes da planta induzindo respostas da planta ao déficit hídrico (Figura 4.).

A primeira e mais sensível resposta ao déficit hídrico é a diminuição da turgescência, e associada a esse evento, a diminuição do processo de crescimento (particularmente o crescimento em extensão), ocorre uma limitação imediata no metabolismo das proteínas e dos aminoácidos, inibindo a síntese de enzimas, principalmente nitrato redutase (Larcher, 2000), as plantas fecham os estômatos; aprofundam o sistema radicular, para explorar um volume maior de solo, diminuindo o tamanho das células; aumentam o espessamento das paredes celulares e a cerosidade da cutícula.

Figura 4. Representação esquemática da regulação hormonal durante o déficit hídrico: (+) respostas aumentadas, ( - ) respostas reduzidas. Retirado de Larcher (2000).


3.2. Mecanismos de tolerância

           São aqueles mecanismos que permitem que a planta continue sendo funcional ainda que tenha perdas de água e produza um déficit hídrico. Neste sentido os mecanismos podem ser separados em dois tipos: os destinados a manutenção da turgescência celular (ajuste osmótico e ajuste elástico) e os que permitem a tolerância à desidratação (tolerância protoplasmática).

3.2.1. Ajustamento osmótico

           É uma acumulação ativa de solutos que leva a diminuição do potencial osmótico e a turgidez plena, e no ponto de murcha permite manter a turgidez celular a baixos potenciais hídricos, com isso mantém o crescimento celular, a abertura estomática e a fotossíntese, favorecendo a tolerância a desidratação e exploração de um maior volume de água do solo. 
          Para Petry (1991) a importância da manutenção do turgor nas células é permitir a continuidade dos processos de crescimento vegetal, expansão, divisão celular e fotossíntese; outro fator é a possibilidade de adiar a desidratação dos tecidos, podendo essas reservas usadas em períodos posteriores do ciclo. Uma vez iniciado o primórdio foliar, o tamanho final atingido é determinado pelo índice de duração da divisão e expansão celular.
         Os solutos acumulados ativamente são basicamente açúcares solúveis e aminoácidos, ainda que em alguns casos também o potássio participa com um papel importante. Os açúcares e os aminoácidos acumulados nas células são resultados das diferentes taxas de fixação e exportação destes compostos. Entre os aminoácidos que têm mais importância no ajustamento osmótico podemos destacar a prolina e a glicina-betaina. 
          A capacidade de ajuste osmótico depende tanto de fatores inerentes à planta como de fatores ambientais: tipo de tecido estudado e sua idade, o grau e a velocidade de desenvolvimento do estresse e o histórico prévio da planta.

3.2.2. Ajustamento elástico

          As paredes das células vegetais apresentam propriedades plásticas e elásticas e são estas últimas as que geram o potencial de turgidez nas células vivas. A plasticidade possibilita a extensão permanente das células em crescimento. O módulo de elasticidade descreve as mudanças do potencial de turgidez em função das variações de volume celular. Valores baixos de módulo de elasticidade indicam uma maior elasticidade das paredes celulares. 
A elasticidade de uma folha está condicionada por diversos fatores: o tamanho celular, a composição química das paredes (representada na proporção dos diferentes componentes), a perda de água apoplástica, a idade da folha e o potencial de turgidez. 
          Os componentes da parede celular e o grau de especialização dos mesmos são os que determinam a elasticidade ou rigidez do tecido. A parede celular primária é composta principalmente de microfibrilas de celulose (C) rodeadas por uma fração matricial (M), formada em sua maioria por hemiceluloses e polissacarídeos pécticos. 
A celulose confere a estrutura básica e apresenta entre 9 e 25% dos componentes da parede celular primária. A fração matricial atua modificando a estrutura básica. Entretanto as pectinas (10-25%) conferem maior elasticidade às paredes celulares, as hemiceluloses tem um papel mais controverso. 
          As hemiceluloses compõem-se principalmente de longas cadeias de xiloglucano que se unem mediante pontes de hidrogênio às cadeias de celulose, formando uma rede que proporciona uma certa rigidez a parede celular. Contudo, variações na composição e organização durante o crescimento celular fazem com que a rede celulose-hemicelulose, seja considerada como uma rede extensa. As paredes endurecem (enrijecem) e adquirem maior rigidez por adição de outros componentes, que formam a parede celular secundária. Na parede secundária (S), a porcentagem de polissacarídeos matriciais, sobretudo de pectinas, encontra-se altamente reduzida e o conteúdo de celulose encontra-se aumentado.
          Por outro lado, a adição de substâncias como a lignina, a cutina ou as ceras, provoca importantes modificações. Ainda que a relação entre o déficit hídrico e a elasticidade não é muito clara, se pode dizer que o aumento da elasticidade tissular permite a manutenção da turgidez (conteúdo relativo de água - CRA) baixa e considerar-se assim um mecanismo de tolerância. Por outro lado, a diminuição da elasticidade comporta a aparição (o aparecimento) de potenciais hídricos foliares menores para uma determinada diminuição de CRA; isso permite uma maior capacidade de extração de água do solo em condições de dessecação e isso poderia fazer que se considerasse um mecanismo de equitação.


3.2.3. Tolerância protoplasmática

          É o mecanismo que permite manter as células vivas a CRA muito baixos. Só dá-se em plantas poiquilohídricas, cujas estruturas e vias metabólicas podem recuperar-se rapidamente de um estado totalmente desidratado. Um exemplo bem estudado é o da planta da ressurreição (Craterostigma plantagineum) que pode sobreviver a CRA inferiores a 10%.

3.3. Mecanismos de escape

          Ocorre em plantas de grande plasticidade, com um desenvolvimento fenológico rápido, que adaptam seu ciclo vegetativo e reprodutivo a disponibilidade de recursos e as condições climáticas. Superam os períodos desfavoráveis na forma de sementes, bulbos, rizomas, etc. Propicia uma alta taxa de sobrevivência, mas uma baixa produtividade potencial. As plantas que não possuem um ciclo anual iniciam o ciclo vegetativo antes da época de seca, assim como floração e frutificação prematuras. Em outras palavras o mecanismo de “escapar” ocorre quando a planta antecipa o ciclo de desenvolvimento.
Grant (1992) afirma que o desenvolvimento de mecanismos de adaptação das plantas é influenciado pelo nível de CO2, pela radiação solar, temperatura e umidade relativa do ar.
          A resposta mais proeminente das plantas ao déficit hídrico, segundo McCree & Fernández (1989) e Taiz & Zeiger (1991), consiste no decréscimo da produção da área foliar, do fechamento dos estômatos, da aceleração da senescência e da abscisão das folhas. Quando as plantas são expostas a situações de déficit hídrico exibem, freqüentemente, respostas fisiológicas que resultam, de modo indireto, na conservação da água no solo, como se estivessem economizando para períodos posteriores. 

4. Senescência

          De acordo com Carlesso (1993) a senescência é um efeito comum para a cultura próximo à fase de maturação; no entanto, pode ocorrer também em situação de déficit hídrico. A senescência é um mecanismo de fundamental influência na produtividade final, pois reduz a área fotossinteticamente ativa da planta (Wolf et al., 1988). 
          O déficit hídrico aumenta a senescência das folhas (Wright et al., 1983); isto ocorre porque o solo seco não pode fornecer nitrogênio suficiente para suprir as necessidades de crescimento da cultura e o nitrogênio do interior da planta é retranslocado das folhas mais velhas para os pontos de crescimento; entretanto, a intensidade da senescência depende da quantidade de nitrogênio no solo, das reservas de nitrogênio na planta e da demanda de nitrogênio dos pontos de crescimento (Wolfe et al., 1988).
A senescência, comparada com a elongação das folhas, tem sido apresentada como um processo menos sensível ao déficit hídrico durante o crescimento vegetativo (Carlesso, 1993).
          O número de dias entre a emergência e a senescência de uma folha individual não é seriamente alterado quando o déficit hídrico se desenvolve gradualmente. Sivakumar & Shaw (1978) afirmaram que, em condições de déficit hídrico no solo, reduz-se a expansão das folhas, acelera a senescência, diminui o índice de área foliar e aumenta a abscisão das folhas. O aumento da senescência no dossel vegetativo tem sido identificado por Wullschleger & Oosterhuis (1992) e Carlesso (1993) como uma limitação potencial na produtividade da cultura. 

5. Xeromorfia, xerofilia e esclerofilia

          Todas as características morfológicas que permitem que as plantas evitem a seca são partes do que se conhece como estrutura xeromórfica. A xeromorfia é um caráter quantitativo e é desenvolvido em diferentes graus em distintas espécies. Pode estar fixada de forma hereditária ou desenvolve-se como resposta de aclimatação as condições ambientais. Assim em plantas que crescem em condições de déficit hídrico moderado, as estruturas xeromórficas se associam com crescimento em condições de turgescência reduzida, dando lugar a estruturas mais compactas e grossas: em paredes celulares, parênquimas, cutículas e ceras, assim como células e espaços intercelulares de menor tamanho. No habitat mediterrâneo aparece outro fenômeno destacável como é a esclerofilia. As folhas esclerófilas estão adaptadas para minimizar as perdas de água e resistir baixos conteúdos hídricos.
          Como exemplo, citaremos que as folhas de Quercus ilex podem resistir déficits hídricos de saturação superiores a 37%, o qual é letal na maioria de espécies mesofíticas. Contudo esta característica da esclerofilia não é geral na vegetação mediterrânea, ainda que se encontra restringida a mesma. Assim, a esclerofilia aparece unicamente em plantas isomórficas perenifólias, sendo as mesmas substituídas por outras heteromórficas caducifólias quando o estresse estival ou invernal (de seca ou de inverno) se faz mais intenso. Pode-se dizer que a esclerofilia é uma resposta frente à baixa disponibilidade de nutrientes e aos herbívoros, dando lugar a uma maior longevidade das folhas para adaptar-se a esta escassez de recursos e a um maior nível de resistência frente a maioria de estresses ambientais, bióticos e abióticos.


6. Considerações finais

          Segundo Bray (1993) a adaptação das plantas a deficiência hídrica depende de várias características fisiológicas e morfológicas, sendo, portanto uma função multigênica, permitindo aos vegetais tolerar a falta d’água em maior ou menor intensidade.
A resposta das plantas ao déficit hídrico pode variar qualitativamente e quantitativamente e cada planta em particular apresenta resposta diferenciada ao regime de umidade do solo (Kumar & Tieszen, 1980).
          É importante o conhecimento do comportamento morfológico e fisiológico das árvores em relação a deficiência hídrica, pois o fluxo de água do solo para a planta e, conseqüentemente, a sua atividade para assimilação e produção, dependem da disponibilidade hídrica e da eficiência do sistema radicular em extrair água do solo.
Nas últimas décadas, muitos estudos foram conduzidos para avaliar o comportamento morfofisiológico das plantas em relação ao déficit hídrico; entretanto, no Brasil poucos são os estudos com espécies arbóreas e considerações sobre o impacto da disponibilidade de água no solo sobre o crescimento e desenvolvimento das plantas têm recebido pequena atenção por parte dos pesquisadores; além disso, faz-se necessário caracterizar a ocorrência do déficit hídrico em termos quantitativos e não qualitativamente, como atualmente tem sido utilizado.


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