Por: Wanda Sily
Não é bem uma floresta, mas tem seus encantos. As árvores, embora raquíticas, devem ter uma associação, um grupo de defesa da espécie para sobreviverem à implacável invasão imobiliária. O menino passa férias com a avó, mas não gosta de sair de casa, culpa da televisão, do Netflix, do DS. A avó então o convida para procurar florestas. Nenhum dos dois acredita que possa haver uma floresta no árido coração de Miami, mas que elas existem, existem.
A avó aproveita o passeio para uma aula de botânica – Do que as árvores se alimentam? Frutas, aposta o menino. A avó explica que árvore não tem pés para ir ao supermercado ou a restaurantes, nem mãos para preparar um sanduíche ou uma macarronada. Para se alimentar ela tem raízes, que usa como canudinhos para sugar do solo a água e os nutrientes de que precisa para viver. E da luz do sol como sobremesa.
Bom se a gente também se alimentasse assim… Nada de cozinha cheirando a frituras, pizza pelo telefone e MacDonald com brinquedinhos chineses. Aqui onde a gente está andando tinha uma floresta, a avó explica. Eu sei, diz o menino, o Katrina derrubou tudo. A avó estava falando do estrago humano, mas tudo bem. O menino aponta uma árvore de belo porte e frondosa copa, e diz, É nessa aqui que o duende mora.
Tanta gente vai e vem no parque-quase-floresta, e cada um vê a seu modo essa mesma árvore majestosa, que assiste indiferente ao passar dos humanos e das intempéries. A avó olha a árvore e diz, Que bela obra da natureza! Alguém mais antenado com Deus diria, Que bela obra do Criador! Mas se acaso um madeireiro ali passasse, vendo a mesma árvore, diria, Essa madeira renderia um bom dinheiro.
A intelectual diria: boa sombra para ler um livro. O agente imobiliário diria, Quanto espaço desperdiçado! A cientista diria, Talvez suas folhas tenham propriedades para curar o câncer. O carvoeiro diria, Daria uns 10 quilos de carvão. A designer diria, Daria uma boa mesa de madeira maciça. O artista plástico diria, Eu esculpiria um cisne nesse tronco. A paisagista diria, Ficaria perfeita no meu novo projeto ambiental.
O otimista veria uma ligação entre passado e futuro: Meus antepassados viram essa árvore antes de mim, meus descendentes a verão depois de mim. A pessimista diria, Não dura mais dois anos… O naturalista diria, Tão forte e poderosa, mas precisa da nossa proteção. A deprimida: Esse galho aguenta uma corda. O pai: Esse galho aguenta um balanço. O curioso se perguntaria, Quantos anos deve ter essa árvore?
A menina: Boa pra esconder do leão! O pintor: Com o pôr do sol ao fundo, dá um lindo quadro. A formiga: Tá difícil chegar no alto! O furacão: Vamos medir forças? A passarinha para o passarinho: Achei a árvore ideal para nosso ninho. O namorado para a namorada: Devia ter trazido meu canivete! José tem um fiapo de carne incomodando no dente. Sem escova ou fio dental à mão, ele medita, olhando para a árvore, Quantos palitos daria!
Fonte: SeculoDiário
Nenhum comentário:
Postar um comentário