terça-feira

Semeador de florestas

Hermes Moreira de Souza, de suas mãos a beleza nas praças e ruas de Campinas (SP)

27/06/2011 - 12:25
Terra da Gente - Josiane Giacomini e Maraísa Ribeiro

No silêncio da própria audição e do caminho, Hermes Moreira de Souza, 93 anos, move-se de carro de sua casa, no Cambuí (não por acaso bairro de Campinas, SP, com nome de árvore), para uma visita ao lugar onde passou boa parte de sua vida profissional como engenheiro agrônomo: as fazendas Santa Elisa e Monjolinho, sede de campo do Instituto Agronômico de Campinas (IAC), onde foi assistente na Seção de Botânica e de Floricultura até tornar-se chefe da área de Floricultura e Plantas Ornamentais e se aposentar, em 1983.
Assim descrito, não dá para ter a dimensão do tamanho do homem atrás das espécies que fez germinar. Mas é de suas mãos que vem a beleza expressa na maioria das praças e ruas de Campinas. Ele, inclusive, dá nome a uma variedade de pata-de-vaca que encontrou em Pereiras, no interior de São Paulo, numa de suas inúmeras viagens de campo. A planta foi batizada de Bauhinia hermesiana. Mas ele também disseminou outras espécies: o goiabão (Eugenia multicostata), a estrela-do-norte (Randia formosa) e a paineira-das-pedras (Ceiba erianthos). E havia sempre uma exigência: quem recebesse as sementes deveria gostar de plantas e, sobretudo, transformá-las em árvores.
Hermes Moreira de Souza – ou doutor Hermes, como é carinhosamente e reconhecidamente chamado – foi o primeiro formador da coleção inicial do Jardim Botânico do IAC, o único do Brasil voltado para a agricultura. Quando o carro chega às portas da fazenda do IAC, aonde não ia há meses, se agita. “Quanto tempo para formar tudo isso!”, diz, apontando para as árvores e plantas que, em sua maioria, chegavam em forma de sementes e hoje dão as boas-vindas aos visitantes com imponência de floresta. “A gente tinha disposição”, admite. Numa parte da área, explica, a mata já existia. Na parte desmatada, foram criadas várias coleções, uma de cada espécie. “Todas essas estufas são do meu tempo”, e vai reavivando a memória a cada metro que avança.
Quando chega ao Monjolinho, o olhar se admira com a própria obra. Antes dele, a área era apenas um terreno de terra vermelha e fértil. Em 40 anos, tornou-se uma floresta plantada, que qualquer leigo jura ser nativa, de tão impressionante que é. E confessa: “Não tinha ideia como é que ia ser.” Primeiro, conta, tinha coleções de plantas anuais. “Depois fui formando as árvores”. Apesar do tempo, o espaço não mudou muito o seu aspecto original. “A base do meu trabalho era aqui.”
Enquanto fala, admira-se com a coleção de bambus. “Olha que beleza!”. Na sequência, volta-se para as paineiras. “Eram de cores diferentes, mais claras, brancas...” E admite: “Eu tenho saudades daqui.”
Desde o início, conta doutor Hermes, ele sempre teve interesse em trabalhar com plantas ornamentais, ao contrário dos demais pesquisadores. Com o tempo, foi mudando o foco para árvores e palmeiras. “Deu no que deu”, diz, sorrindo.
Quando desce do carro, sua floresta parece abraçá-lo. O olhar, por alguns instantes, voa para o alto, brilhante, como quem se vê fechando um círculo em torno de si mesmo. Não é para qualquer um transformar chão batido em mata fechada. Seu mundo está posto.
 

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